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domingo, 5 de maio de 2013

O SILÊNCIO É AZUL




Depois de uma certa idade ("certa idade" será que é porque te olham na cara e a idade é certa?), passei a ter medo de altura (logo eu, que sonhava em ser trapezista!) e de gostar de vermelho, cor que eu sempre detestei. Porém, estar perto perto de um dos monumentos naturais mais importantes do mundo e não ir visitar é covardia "por demais". Fui e não me arrependi nem um pouco.

Para se visitar o Gran Canyon há várias empresas que oferecem o passeio, com preços e duração distintos. Antes de embarcar, comprei pela internet o tour da empresa Papillon.  Com duração de praticamente o dia inteiro, o passeio me custou 109 dólares, almoço incluído. Saímos às 7h30 da manhã e voltamos por volta das18h. O motorista, um afro-americano muito engraçado, nos divertiu com piadas durante praticamente todo o trajeto. Faz parte do show.



Depois de algumas trocas de ônibus, desembarcamos num dos pontos chamado Skywalk. Tem esse nome porque os corajosos - eu de fora desta - pagam 29 dólares a mais para percorrer uma passarela de piso de vidro que se estende vários metros em balanço sobre um dos precipício do Gran Canyon. Toda a região é administrada e de propriedade de índios Navajos e de outras etnias aborígenes. 

São eles que operam os pequenos ônibus que fazem ininterruptamente um percurso, de forma que o visitante possa tomar um destes, descer, visitar um local e depois tomar outro, sem ter de pagar nada. São três pontos turísticos, dois dos dos quais exploram a beleza solitária do Canyon, o terceiro imita (mal) uma rua do faroeste, com xerifes, bandidos e carroças. 

Fugindo de sol escaldante, entrei num bar com portas vai-e-vem e lá dentro um cara ao violão cantava "Mamma Meggie", um dos hits de Jane Jopplin.  Matei saudade dos bons tempos de acampamento em Trindade (RJ).

A paisagem é realmente muuuuito bonita, mas desoladora.Creio que seja como os famosos lençóis maranhenses: viu um quilômetro, o restante é uma repetição deste. De qualquer forma, aquele silêncio, vegetação cinza, e as rochas azuladas devem ser muito mais fascinantes para as águias que planam por entre os abismos e, sortudas, flagram os melhores ângulos.

Aquelas fotos arrebatadoras do National Geographics devem ser tiradas em momentos do dia que são exclusivos. Como nosso tour não tinha este foco, a preocupação em se chegar ali com uma luz boa foi zero.  E quem quiser que se vire nos trinta para se livrar das sombras verticais do meio-dia.


CASSINOS E TÁXIS




Las Vegas,  a cidade do Pecado, para fazer jus ao nome, vive em função dos cassinos e dos show considerados eróticos, com garotas nuas ou de top-less. Apenas um hotel tem espetáculo de strippers masculinos, mas tipo Clube da Luluzinha, só para mulheres. Cantores famosos e outros nem tanto já passaram e ainda passam por aqueles palcos. 

Se os hotéis são gigantescos, os cassinos ali instalados têm mais de 300 máquinas caça-níqueis, além de roletas e cartas. Para atrair qualquer um, eles dispõem de restaurantes, bares, lanchonetes e muitas máquinas ATM, para saques emergenciais de dinheiro. Investi 3 dólares que nunca mais voltaram…

Eu não sabia e não vi escrito em lugar algum, mas táxis não podem parar na Strip e redondezas. O que se faz para tomar um táxi quem não teve a sorte de ficar perto desta avenida e já está com os pés em bolhas de tanto bater perna? Entra na fila de um Taxi Stand de um hotel e aguarda sua vez. Se for num fim de semana,  amargue uma fila que pode demorar horas.

Sem muita paciência para filas, tentei tomar um "cab" numa transversal. Fiquei longo tempo acenando inutilmente para os táxis que passavam.  Quando já estava conseguindo por telefone, parou um motorista que me levou direto para o meu hotel, que ele sabia muito bem onde era. 

MEGALOMANIA AMERICANA





Tem lugares que  revelam a alma de um país. Assim como (para mim) o Rio de Janeiro é a cara do Brasil, Las Vegas traduz os Estados Unidos em toda a sua megalomania. Um cidade com lagos, cascatas, vulcões erupindo, jardins floridos em plena terra esturricada do deserto parece querer confirmar " Yes, We Can." Sim, é impactante o que se vê na Strip e ou mesmo em Downtown. 

Tudo é grande e se não é imita à perfeição seu congênere existente em qualquer lugar do mundo. Uma pirâmide com uma gigantesca Esfinge, imitando Keops, uma Torre Eiffel, que - dizem - tem a metade do tamanho da original, uma (meio gorda) Estátua da Liberdade, uma caravela imensa que simula um batalha com outra na frente de um hotel. Canhões explodem, caravelas afundam num oceano artificial. Os canais de Veneza, com gôndolas reais e céu artificial ! Será que Joãosinho Trinta inspirou-se aqui ou vice-versa?

Fiz o passeio diurno e noturno num ônibus Hop-on Hop-Off a 56 dólares os dois. O tour diurno tinha um guia que já havia visitado o Rio de Janeiro e sabia dizer com sotaque forte "Tudo bem, tudo bom?" , o que fazia sempre que passava por mim dentro do ônibus. Meio patético, chegou até a dançar desengonçadamente para fazer rir a platéia. Virei o rosto engolindo a vergonha alheia.

À noite, na companhia de muitas senhoras de idade, que, espertas, evitaram o sol escaldante do tour diurno, fiz praticamente o mesmo percurso, da Strip para Downtown  Mas, como eu previra, a cidade vira outra coisa quando se ilumina. Las Vegas sai muitíssimo bem na foto à noite. Como as meninas que fazem stripp nas dezenas de casas de show, a Sin City brilha e se mostra misteriosa à noite.



Por sorte, nesta época a temperatura noturna é agradabilíssima. Ao ar livre, nas ruas é como em qualquer cidade do Nordeste, menos Recife, claro. Se muito, a temperatura deveria estar por volta dos 26 graus. No alto verão, o calor bate os 45 graus!! 

O tour noturno tem uma parada no centro da cidade, que já foi barra pesada, com prostituição e rufiões perigosos. Recuperada, agora a área é tranquila, com famílias passeando sem medo pela Fremont, a principal rua do bairro. 

É ali que existe a maior projeção de vídeo do mundo em toda extensão do teto de uma galeria. A megalomania continua no hotel que exibe a maior pepita de ouro do mundo!



VEGAS, A CHEGADA



(fotos estao travando o computador; quem sabem,mais tarde...)
A chamada Sin City me recebeu de forma pouco amigável . Mea culpa, mea maxima culpa. Cometi o pecado mortal de não acomodar meus cosméticos no saquinho oficial e de portar um protetor solar com mais de 100 ml.  Consequencia lógica:  o guarda interceptou a mala tipo-de-aeromoça, que a Kayle me emprestara na véspera. "De quem é essa mala", o vozeirão do guarda afro-americano me fez despertar da letargia do vôo de 60 minutos entre SD e Vegas. Lembrei da minha necessaire. Tarde demais. O atarracado me pediu, com a gentileza que nao se espera de um agente de fronteira, para aguardar a poucos metros dali, e me perguntou se eu transportava algum líquido com mais de 100ml. Sim,um protetor solar comprado dias antes da partida. I`m sorry.

Tentando ser simpático, o rapaz me disse que eu tinha sotaque francês. Corrigi-o dizendo que era brasileiro. Foi a palavra mágica. O guarda passou a falar de coisas do Brasil, entre as quais "as belas mulheres brasileiras" . Rimos juntos e o clima ficou menos tenso. Minutos depois eu estava liberado para entrar  - sem o protetor solar - na Cidade do Pecado fincada no meio do deserto no estado de Nevada.

Em vão, tentei vislumbrar, no saguão, alguém do hotel me aguardando com com meu nome numa plaquinha. Peguei um táxi, mostrei o endereço e já adiantei - com a juba de leonino eriçada - que conferira o caminho no Google. Ele ainda fez que não sabia o trajeto. "Se o senhor usar o GPS, ele vai lhe indicar sem erro o caminho", enfatizei irritado lançando mão de todo o inglês que me vinha à cabeça. Vinte e cinco dólares custou a corrida, que poderiam ter sido pagos com cartão de crédito (todo os táxis tem a maquininha) ou cash.

O hotel ficava a uns 3 quilômetros da famosa Strip, que é a rua mais badalada, onde estão os hotéis mais caros e os shoppings mais loucos de Las Vegas. Perguntei se dava para ir a pé e o recepcionista me perguntou surpreso se eu estava mesmo muito disposto a andar ou não preferia pagar 8 dólares de táxi. Optei por abrir a carteira e evitar aquele sol de quase meio-dia sem o protetor confiscado no aeroporto.

DINOSSAUROS HIPPIES




Não sou nada bom de matemática, isso não é novidade para ninguém. Mas fiz as contas com a ajuda da calculadora do meu celular e constatei: quem no auge do movimento hippie tinha 30 anos, hoje está com quase 80 anos de idade! Todo este esforço mental foi motivado por uma cena que presenciei no trolley: numa determinada estação, entra um casal de, digamos, meia-idade. Alguns fios do que deve ter sido uma vasta e longa cabeleira saíam debaixo de um chapéu de abas largas do senhor que tremulava apoiando-se numa bengala. Óculos john lennon deviam esconder um rosto marcado pelas décadas ou quiçá pelas drogas.

O que se via daquele corpo magro estava coberto de tatuagens, as orelhas mal suportavam o peso de dois grande brincos de metal em forma de cunha. Trajava uma surrada bata e calça estilo indiano: nos pés, uma sandália de couro evocava os artesãos da era Love & Peace. 

Observando aquele dinossauro hippie, me percebi diante de alguém que deve ter sido um ativo militante do movimento hippie e que ficou congelado no tempo - como uma foto na parede - junto com sua companheira. Um pouco menos velha que ele, braços com muitas tatuagens,  cabelo bicolor, ela usava aqueles óculos redondinhos coloridos que foram fashion na contracultura da época. A bem da verdade, San Diego está cheia destes eternos contestadores, que o povo finge não ver. Mas, eles perambulam pelas ruas...

PRAIAS E DESERTO NO QUINTAL




Preciso dizer que estou adorando a vida em San Diego. Com certeza, algum teórico já deve ter descoberto antes de mim que um cérebro mais vivido demora mais tempo para se adaptar às novas situações. Como um objeto recém-comprado que precisa de um certo tempo para se amalgamar ao ambiente. Quantas vezes adquiri alguma coisa para casa que de início me pareceu inadequado, mas que um dia depois ele me pareceu ter sido criado para ficar ali. Este estranhamento inicial me levou a ver a cidade com os olhos de quem vê Berlim. Nada mais errado. Culturas, meio e fins totalmente distintos. 


San Diego, diz uma reportagem da Forbes, é o quinto melhor lugar para se viver nos EUA, é a quinta cidade mais rica do país e está entre as 10 mais seguras América do Tio Sam. É cercada por 70 milhas de praias, muitas delas de areia fininha e outras com pequenas baías entre falésias altíssimas. 

O povo é uma mistura de mexicanos, militares, estudantes, surfistas, gente muito rica em casarões cinematográficos de La Jolla, hippies e neo-hippies que habitam uma região de Ocean Beach. O centro da cidade, Downtown, tem as calçadas mais limpas que já vi. É nessa região que estão os arranhacéus moderníssimos e de bom gosto, cujo conjunto, visto da ilha de Coronado,  virou cartão-postal da cidade. Sem contar que  que  o deserto está logo ali no quintal!

Como toda cidade de país desenvolvido o conceito de bom ou ruim em relação à qualidade de vida passa por entendimentos que não contemplam as nossas carências de país em desenvolvimento. E, por mais que se viaje leia ou teorize, na hora do vamos ver o modelo subdesenvolvido emerge. Sempre que pergunto qual o bairro melhor ou o pior para se morar, alguém diz que lugar é ruim quando o transporte público está a mais de três quadras da casa ou se  nesta mesma distância não há supermercados, um restaurante, uma  farmácia. Então, sem medo, está fora de cogitação um lugar com ruas sem asfalto, calçadas esburacadas, postes sem iluminação e esquinas baldias cobertas de lixo.

Para quem já passou deste estágio, há dinheiro de sobra para cuidar de outras questões. Nunca tinha visto circulando por uma cidade tantos cadeirantes, ou pessoas com andador. Curioso também é que ninguém, em nenhuma situação cotidiana, ajuda estes "discapacitados"a subir ou descer de um ônibus!  Deve haver um acordo tácito entre as partes. Como me locomovo pela cidade em transporte público, posso afirmar que 80% das minhas viagens acontecem com a presença de alguém em cadeira de rodas, elétricas, claro. Alguns já reconheço, de tanto vê-los.

Os ônibus, além de incorporarem um sistema que os fazem "adernar", que nem barcos, para ajudar os passageiros a embarcar, têm os primeiros bancos atrás do motorista reservados e adaptados para receber os cadeirantes. Pois, assim que o motorista ver um deles num ponto, faz baixar uma plataforma, que parece uma língua, pela qual entra o "discapacitado". Os bancos são levantados e a cadeira é fixada por correias pelo próprio motorista, que não demonstra qualquer sinal de impaciência ou má-vontade, longe de parecerem com os que trabalham na linha Praça da Sé-Vila Brasilândia.

Assim como não movem um dedo para ajudar estas pessoas,  os passageiros também parecem dispor de todo o tempo do mundo para aguardar o desfecho de todo aquele processo. Uns lêem, outros teclam nos seus smartphones e outros  simplesmente jogam o olhar perdido pela janela. Tento fazer o mesmo, mas minha curiosidade fala mais forte.