G'MORNING, CALIFORNIA!
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Old Town |
Quando entrei no ônibus que me levaria ao aeroporto de Cumbica me dei conta de que aquela seria minha terceira temporada fora do Brasil, como naqueles seriados americanos, tipo Lost. Meu vôo da Delta estava marcado para sair às 20h55 e o trânsito das 17h30 em todo trajeto do ônibus era nada menos que caótico. Minha cara deveria estar exalando tanta preocupação que o motorista me perguntou pela hora do vôo e me tranquilizou dizendo que estaríamos lá mais ou menos às 19h. Meu medo era de que fosse "mais" do que "menos". Para piorar, um pequeno acidente próximo à entrada do aeroporto fez o transito desandar ainda mais. A previsão do motorista se confirmou e, por volta das 19h, lá estava eu arrastando minha mala azul em direção ao guichê da Delta. Ainda bem que eu havia feito checkin pela internet.
A opção por 100 dólares para um assento na categoria Confort foi mais que acertada. E a escolha na fileira da saída de emergência ídem. Era quase uma classe Executiva. A poltrona reclinava bastante oferecendo espaço de sobra para esticar as pernas. Agora era encarar as 11 horas até Detroit. Do meu lado, um americano sem graça tentou inutilmente ocupar uma poltrona numa fileira vazia. Sem vontade para papo, me virei e tentei dormir. Não consegui. A temperatura dentro da aeronave era torturante, mesmo eu usando um agasalho e a mantinha da companhia aérea. Pedi uma taça de vinho para me aquecer.
O ponteiro do meu relógio de pulso marcava pouco mais das 8h quando o comandante anunciou que iriam começar os procedimentos para aterrissagem no aeroporto de Detroit. Seguindo as placas, acabei chegando na Imigração. Respondi as perguntas de praxe, como o que iria fazer nos EUA e quanto tempo permaneceria em solo americano. Por sorte, o policial que me atendeu parece ter gostado quando disse quer era aposentado e que estava aproveitando o tempo livre para viajar. Carimbou 6 meses de autorização para permanência na América. Pena que minha programação para esta temporada destinava menos de 3 meses na terra de Obama. Como era previsto, peguei a mala, que passou novamente pelo raio X, desta vez, americano. De pé numa espécie de cabine, um scanner me esquadrinhou todo o corpo, enquanto um casal de policiais me instruía sobre a melhor posição naquele cubículo. Fiquei me imaginando aparecendo sem roupa na telinha. Conti o riso.
De novo na sala de embarque, me vi obrigado a atrasar o relógio em 1 hora para combinar com o horário local. O próximo voo para San Diego sairia às 8h37. E saiu. A aeronave de linha doméstica não me permitiu a classe Confort do trajeto internacional. Peguei assento no corredor, que me dá melhor condição de esticar as pernas e evita transtornos para ir ao toalete. Ao lado de uma jovem que vinha de NY e um senhor que lia um livro grosso, aguentei firme as 5 horas pelos céus norte-americanos até San Diego. Bateu fome e comprei no próprio avião um iogurte com frutas e um sanduíche de queijo e presunto. Comida de avião é ruim em qualquer lugar, pensei enquanto mastigava aquele objeto sem gosto.
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Fachada da casa |
DANIEL NÃO VEIO - PRIMEIRO DIA
Americanos não são alemães. Daniel, filho da Ann em cuja casa eu hospedaria, ficou de me buscar no aeroporto. Esperei quase 60 minutos e ninguém apareceu dentro de um Toyota vermelho-vinho, com uma placa com meu nome no para-brisa, como informara minha anfitriã nos vários emails que trocamos no processo pré-viagem. Com o humor de quem não pregou o olho durante toda a viagem, decidi tomar um táxi. O motorista mexicano me cobrou 20,80 dólares até a porta da casa da Ann, no condomínio Loma Riviera. Sem ter 80 centavos, a corrida acabou ficando por 20 dólares. Arrastei minha mala azul até a entrada da casa, procurei uma campainha e não achei nada. Girei a maçaneta da porta, que por sorte estava aberta e entrei na casa, traduzindo para o inglês o nosso "Ô de casa"! Não havia viv"alma dentro daquele sobrado. E eu sem linha telefônica nem internet. Relaxei e aproveitei para atrasar mais 4 horas no meu relógio.
Aguardei alguns minutos, matutando o que iria fazer. Ciente de que não havia ninguém na casa, subi ao primeiro andar e procurei um cômodo que pudesse parecer aguardar algum hóspede. Dos quatro quartos, apenas um estava arrumado, com cama feita. Deve ser o meu. Entrei e vi sobre a mesa um cartão de visitas com o telefone do Daniel. Desci e liguei do fixo para ele. Sem muitos rodeios, perguntei qual era o meu quarto porque precisava dormir. Ele confirmou o que eu já havia deduzido. Pouco tempo depois, Daniel chega se desculpando, dizendo que me esperara por 40 minutos. Ok, no problem, o que eu mais precisava naquele momento era de um bom banho e uma cama para dormir. Dito e feito
Não sou do tipo que dorme com facilidade, mesmo numa cama confortável como aquela. Na verdade, dei uns cochilos e, por volta do meio-dia levantei-me e fui procurar um lugar para uma refeição, que meu organismo nem sabia se seria almoço ou jantar. Seguindo as dicas do Daniel, fui até o Point Loma Boulevard e vi que não faltavam opções. Entrei num bufê de saladas, sopas e massas chamado Souplantation. Por 7,50 (com a taxa), comi a salada que quis e repeti a sopa de legumes. Arrematei a refeição com um frozzen yogourt de baixa caloria, que é a pegada desse restaurante. Dei um giro para fazer a digestão e vi supermercados, restaurante Thai, pizzaria delivery e a academia feminina Curves, que já chegou ao Brasil há anos.
Voltei pra casa para merecida siesta. Dormitei um pouco e ao sair para beber água, dei de cara com o Sam, que estendeu a mão se apresentando. Descemos juntos a escada carpetada, que termina ao lado da porta de entrada. Sam tem 27 anos, nasceu em San Diego e não faz nada a não ser viajar. Detalhe: de bicicleta ou mesmo a pé. Longos cabelos loiros, olhos azuis e zero gordura no corpo, ele também não dispensa um paredão de pedra para escalar. Conversamos muito e combinamos várias coisas, entre elas, alugar um carro para girar pela Califórnia. Tipo Easy Rider em quatro rodas. Alegando sono, me despedi e cai na cama dormindo como um leão velho.
COMMING BACK TO THE SEVENTIES - SEGUNDO DIA
Acordei relativamente cedo. Desci para preparar o meu café da manhã. Sam já havia acordado e se propôs ir de bicicleta até o supermercado para comprar bananas. Voltou com 5 bananas, uma das quais usei para uma vitamina com aveia, que Daniel também aceitou. Já estava me sentindo em casa, abrindo a geladeira, pegando as coisas. Entrei no espírito-anos 70 da casa! Daniel convidou para irmos vê-lo surfar na Ocean Beach/Cliff. Fomos ne camioneta Toyota vermelho-vinho. Percebi que não estávamos longe do mar do Pacífico. Cerca de 10 minutos depois descemos do carro. Que decepção, o mar estava liso, sem uma onda sequer! Decidimos caminhar margeando a praia.
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Daniel (esq.) e Sam
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A paisagem é bonita, mas praia mesmo, com areia, como conhecemos, não há por ali. São penhascos altíssimos, que apavoram quem tem medo de altura, como eu. O mar estava azul claro, esfumaçado, como se uma bruma deixasse tudo com jeito de aquarela. Perguntei se era sempre assim e me deram uma desculpa não convincente, que entrou por um ouvido e saiu pelo outro.
Voltamos para casa, com a promessa de irmos com o Sam a uma feira orgânica que acontece toda quarta numa rua (Newport) perto daqui. Não deu, comecei a sentir a fatídica dor na altura do cóccix (extremidade inferior da coluna vertebral), que para mim prenuncia um resfriado. Acionei minha caixinha de primeiros-socorros e maldisse o frio torturante da aeronave da Delta.