Rua de Tijuana, com colorido mexicano |
Estar a menos de 25 quilômetros do México deixa qualquer aventureiro de alma cigana, como eu, com "ganas" de conhecer o país dos maias. Busquei um daytour para visitar Tijuana, a primeira cidade mexicana ao sul da Califórnia americana.
O google me deu a dica da empresa Five Stars, que, por coincidência, tem escritório bem perto da minha nova residência. O preço não era dos mais altos, 62 dólares, mas eu precisava ligar para saber se poderia pagar no local, porque o meu MoneyCard Visa só permite uso presencial. O que significa que não posso adquirir nada com ele via internet, porque preciso - na maioria das vezes - assinar o comprovante de compra do serviço ou produto. Essa limitação talvez seja a parte desfavorável de se usar este tipo de cartão de débito. No mais, só não ficar recebendo troco em moedinhas de um cent já é um alívio…
Arco de entrada da ciade |
Usando minha linha T-Mobile pré-paga, liguei e fiquei sabendo que poderia pagar cash ou com cartão na loja da Five Stars meia hora antes do início do tour, marcado para as 14h daquela quinta-feira ensolarada. Ótimo. Carreguei celular e bateria da câmera porque altas fotos me aguardavam do outro do "checkpoint" San Isidro.
Sem pressa, almocei no vietnamita uma comida apimentada, peguei o trolley na Washington Street e bem antes das 13h30 me apresentei no escritório da agencia de viagens, que funciona no belíssimo prédio histórico da estação Santa Fé.
Imigração em San Isidro |
O ônibus que levaria os 15 passageiros parecia um schoolbus pintado de branco. Um grupo de loiras americanas me perguntou se eu saberia dizer se aquilo seria mesmo o nosso ônibus, pois haviam tentado obter a informação junto a um senhor baixinho com cara de chicano, "mas ele não falava inglês". Percebi nesta observação, e na cara que ela fez, uma pitada de preconceito pouco disfarçado. Aliás, americanos engolem mexicanos, como os alemães engolem turcos. Com disfarçada dificuldade.
ABDUZIDO PARA TAIPÚ
Nossa guia chegou esbaforida tentando desculpar-se por alguns minutos de atraso. Magra, de indubitáveis 150 centímetros de altura, a nossa guia iria nos contar verdades e invencionices por todo trajeto da viagem de 5 horas. Daquela boca, em cuja arcada inferior faltavam pares de dentes, saiu a informação de que Tijuana acomodava uma população de mais de 3 milhões de criaturas. "Believe or not", como adorava repetir a mulher nascida em San Diego, mas com visível origem mexicana.
Mariachis |
Advertidos, todos portamos passaportes válidos que poderiam ser solicitados na fronteira. Descemos do schoolbus e entramos no posto de Imigração, que por sorte, estava praticamente vazio de turistas.
Depositamos nossas bagagens na esteira de raio-X e nos dirigimos em fila indiana para as autoridades de fronteira. Fomos liberados, sem uma pergunta sequer. Menos mau.
Do outro lado, já em território mexicano, as instalações também são novas, estilo moderno, muito vidro e estruturas metálicas às vistas. Pegamos o ônibus e percorremos as ruas de Tijuana. Se a primeira impressão é a que fica, infelizmente, a cidade era tudo menos bonita, agradável, arborizada, acolhedora.
Paramos na frente de um restaurante para saborearmos dois tacos mexicaníssimos, como cortesia da Five Stars. Mesmo já tendo almoçado, degustei aquela porção mínima de feijão (marron) postado no prato ao lado de duas coisas arredondadas cobertas por cubos de carne cozida. Uma Fanta (paga a parte por 2,70 dólares) me fez engolir aquele lanche. Ok, os americanos também tem seus hamburgers intragáveis para minha atual vibe naturalista!
Centrinho de Tijuana |
Longe do propagado charme cultural de outras cidades do país, Tijuana parece reforçar a dicotomia pobre & rico numa sociedade nada justa. Só os mariachis e as cores berrantes de algumas fachadas confirmavam que eu estava em solo mexicano. Mas, dispensasse a língua e os letreiros em espanhol, eu poderia apostar que havia sido abduzido para alguma cidade do interior nordestino, talvez uma Taipú ou Escada de muitos anos atrás.
Quinquilharias turísticas, entre as quais os populares sombreros e ponchos, se equilibram em araras improvisadas que invadem as calçadas.Tudo muito barato, pelo menos, nesta parte da cidade. Por 4 dólares, qualquer um pode devorar um farto prato de comida típica. Um táxi da fronteira até aquele centro também custa de 3 a 4 dólares. Um taco, pouco mais de 1,5 dólar! A cotação é extremamente favorável para quem tem as verdinhas, que são super bem aceitas em Tijuana.
COMING BACK
Depois de tentar em vão encontrar algum ângulo interessante para fotografar, decidi voltar ao ponto combinado na Calle de La Revolución. As loiras americanas e a senhora que manca de uma perna torta já estavam lá aguardando a chegada da nossa falante guia. Para não decepcionar pra sempre os visitantes, nosso ônibus percorreu uma longa avenida chamada Paseo de los Heroes, mostrando edifícios altos, modernos shopping centers (Aguas Calientes) envidraçados, com jardins de um verde impecável! E estátuas dos heróis, por supuesto, hombre!
Praça Santa Cecilia, centro de Tijuana |
Sim, esta parte da cidade imita com perfeição o outro lado, com calçadas apresentáveis, 7Eleven, Pizza Hut, etc. Mas, dura pouco e logo voltamos a percorrer uma paisagem que lembra nossas favelas, porém, mais arrumadas e sem barracos.
Mais adiante, delimitando os dois países passamos pelo muro com arame farpado e cruzes lembrando os mexicanos que morreram tentando atravessar para o "paraíso americano" . Impossível não me lembrar, com tristeza, do muro de Berlin.
Fila para passar pela Imigração, na volta |
Para evitarmos as intermináveis filas nos acessos de retorno à fronteira, nosso motorista optou por outra passagem, mais distante no centro de San Diego, porém mais rápida nos tramites da Imigração. Sim, mesmo assim, voltar é mais complicado. Há duas filas: uma para quem tem cartão de acesso livre e outra para visitantes comuns, como nós.
A fila anda rápido até chegarmos, com passaporte em mãos, ao interrogatório das autoridades. Quanto tempo em Tijuana e se trazia alguma coisa na bagagens foram as perguntas feitas a mim pelo americano com cara de mexicano. Nem carimbo meu passaporte recebeu.
Já passava das 19h quando nosso grupo cruzou a fronteira para aguardar o ônibus da Five Stars. Por algum motivo que nem a nossa guia soube explicar, a demora foi de mais de 45 minutos sob o vento frio do anoitecer. Retirei da mochila meu providencial agasalho. Nossa viagem terminou onde começara, atrás da estação Santa Fé, onde tomei o trolley que me deixou em casa três estações adiante.
Tijuana nunca mais, believe or not.